25 de junho de 2011

VIDA. DEPOIS DA MORTE?

A ansiedade pela vida eterna é tão antiga como a raça humana. Evidência disso nos é dada no “Livro dos Mortos” que os antigos egípcios depositavam nos sarcófagos dos seus mortos como uma espécie de passaporte para o além. O livro completo teria cerca de 150 capítulos, mas as cópias existentes raramente são completas. O texto, geralmente em bela escrita hieroglífica, contém ilustrações fascinantes, e representa preces, confissões e encantamentos que visam a persuadir ou subornar os guardiães do além a admitirem o morto à bem-aventurança eterna. A cena mais conhecida é a da pesagem do coração pelo deus Anúbis. O coração é representado num prato da balança e no outro uma pena, que simbolizava a justiça, enquanto o deus-escriba, Thoth, anota o resultado do julgamento. Outra ilustração
mostra o deus Hórus apresentando o defunto justificado perante Osíris, o deus dos mortos. Nenhuma despesa era poupada pelos mais abastados para preservar o corpo de desintegração por embalsamamento, sendo a múmia então depositada numa capela funerária, onde ofertas de alimentos eram trazidas piedosamente, e preces oferecidas.
A verdade, porém, é que os antigos egípcios tateavam nas trevas, sem certeza alguma de que suas esperanças pudessem realizar-se.
Somente com a vinda de cristo a este mundo é que o mistério impenetrável da morte foi quebrado. Tudo se transformou com o aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus, o qual não só destruiu a morte, como trouxe à luz a vida e a imortalidade, mediante o evangelho. O que antes era uma vaga esperança acalentada pelos mortais, tornou-se agora uma certeza triunfante, porque Cristo, pela Sua ressurreição, triunfou sobre a morte e o túmulo.
Com esta breve introdução, propomo-nos examinar alguns outros aspectos da doutrina bíblica aqui defendida de que ninguém vai ao Céu por ocasião da morte, mas devem todos aguardar a ressurreição do último dia. Para não cansar ao leitor, e dar oportunidade a que as objeções sejam ouvidas, estudaremos o assunto na forma de perguntas e respostas.
Objeções e Respostas
Se é verdade que ninguém vai ao céu por ocasião da morte, por que teria Paulo declarado certa vez: “Temos, portanto, sempre bom ânimo, sabendo que, enquanto no corpo, estamos ausentes do Senhor…Entretanto estamos em plena confiança, preferindo deixar o corpo e habitar com o Senhor”? Não diz Paulo, textualmente, que preferia deixar a presente existência e habitar com Cristo?
Lembremo-nos de que, nessa carta, Paulo não pode contradizer o que disse na primeira carta aos Coríntios, escrita uns três meses antes. O que Paulo tem em mente é esclarescido pelo contexto, começando com o verso 1. O Apóstolo chama o corpo atual de “casa terrestre” ou “tabernáculo”, na qual casa a melhor das existências é um gemido angustiado. Sua esperança não é ser despido deste corpo mortal, mas ser revestido, “para que o mortal seja absorvido pela vida” (verso 4). Ora, em I Coríntios 15:52-54 Paulo deixa claro que o mortal será revestido da imortalidade em duas, e unicamente duas, circunstâncias:


1º) Os que estiverem vivos, quando soar a “última trombeta”, serão simplesmente “transformados”, isto é, revestidos de incorruptibilidade, “num momento, num abrir e fechar de olhos”;
2º) Os que estiverem mortos “ressuscitarão incorruptíveis”. Para Paulo, que esperava estar vivo por ocasião do advento de Cristo, preferir deixar este corpo mortal e estar com o Senhor era apenas outra maneira de expressar sua esperança de ser revestido de imortalidade sem experimentar a morte, “num momento”.
Essa explicação cuida da passagem em II Coríntios 5. Como, porém, compreender a passagem de filipenses 1:23, onde ele externa o desejo “de partir e estar com Cristo” ? Não implica este texto na existência de uma alma que abandona o corpo e sobe a presença divina?
Sem dúvida, esta é a primeira impressão, ao lermos o texto. Mas primeiras impressões nem sempre são corretas. Se tal fosse verdade, Paulo não teria frisado, nesta mesma carta, a importância absoluta da ressurreição. Paulo que sacrificara tudo “por causa da sublimidade do conhecimento de Cristo Jesus”, ansiava conhecê-Lo ainda melhor e “o poder de sua ressurreição e a comunhão dos Seus sofrimentos, conformando-me com Ele na Sua morte; para de algum modo alcançar a ressurreição dentre os mortos” (Filipenses 3:11). Se houvesse outro modo de estar com Cristo sem ser através da ressurreição, Paulo não colocaria a ressurreição dentre os mortos como alvo supremo de sua carreira cristã.
Aproximadamente doze anos tinham passado desde que Paulo escrevera suas Cartas aos Coríntios. Agora, prisioneiro em Roma, aguardando a qualquer momento a sentença de morte, Paulo ainda punha sua esperança de vida eterna na ressurreição. Mas para quem dorme em Cristo, o intervalo entre a morte e a ressurreição é um só momento, tão rápido como a noite, para quem dorme um sono perfeito. Nesse sentido, à véspera de seu martírio, é que Paulo nutria o “desejo de partir”, isto é, dormir o sono da morte, para logo, como quem acorda surprendido com a luz da manhã, “estar com Cristo”. A morte não tem terror para aquele cuja vida “está escondida com Cristo em Deus”.
Se tudo se dissolve com a morte, se não há uma alma que sobrevive, onde fica nossa identidade individual? Não é a personalidade o que temos de mais autenticamente nosso? Que certeza podemos alimentar de que nossa identidade não se perde ao cerrarmos os olhos na morte?
Não há dúvida de que a morte é a prova suprema da fé. O crente precisa estar preparado para fazer o que os teólogos chamam o “salto da fé”. A perplexidade do ser humano é semelhante à da criança que, de pé junto ao alçapão aberto, ouviu a voz do pai, que do porão escuro lhe dizia: “Salta, meu filho, que eu o tomo nos braços”. “Mas eu não vejo nada,” replicou a criança. “Não importa, meu filho, eu o vejo”. A criança não mais hesitou e saltou, para ser tomada nos fortes braços do pai. Assim o filho de Deus confia em que os “braços eternos” o receberão; tem a palavra de seu Pai como garantia. Ao exalarmos o último suspiro, “nossa vida está oculta juntamente com Cristo, em Deus.

Quando Cristo que é a nossa vida Se manifestar, então” nós também seremos “manifestados com Ele, em glória” (Colossenses 3:3-4). Nossa identidade não é obliterada se está oculta “com Cristo, em Deus”. Nossa personalidade, que não pode existir independente do corpo, e que não pode ser identificada com o corpo, é guardada na memória de Deus, que no-la devolverá na manhã da ressureição.
Não são as manifestações espíritas, com sua invocação dos mortos, uma prova palpável de que a alma sobrevive ao corpo?

Nos chamados fenómenos espiritualistas, muito pode ser explicado na base de auto-sugestão, hipnose coletiva, prestidigitação, ou simples fraude. Há admissivelmente um resíduo de fenómenos que não pode assim ser explanado. Esse resíduo de fenómenos que poderiam ser chamados genuinamente sobrenaturais, deve ser comprendido como a atividade de espírito de demônios “capazes de operar sinais e prodígios para enganar”, como disse Cristo, “se possível, os próprios eleitos”. (Apocalipse 16:14 e Mateus 24:24).
Que significa a expressão “Espírito de Demónios?
Esta expressão bíblica se refere ao que Paulo chama “as forças espirituais do mal, nas regiões celestes”. (Efésios 6:12). Paulo não partilhava da opinião, entretida por alguns hoje, de que não há “ressurreição, nem anjo, nem espírito”.(Actos 23:8). Isto era o que pensavam os saduceus, seus contemporâneos, que podem ser caracterizados como semi-agnósticos. Para Paulo, como para o próprio Cristo, a realidade de Satanás estava além de qualquer dúvida. Nas páginas da Bíblia ele aparece sob várias designações: “diabo”, “príncipe deste mundo”, “príncipe do mal”, “a antiga serpente”; mas sua identidade é sempre a mesma.
Não é ridículo entreter tais opiniões em nosso século de luzes? Qual teria sido a origem de Satanás?

Nunca é ridículo, creia-me, aceitar o que é claramente um ensino bíblico, e, confrontados como somos com o problema da existência do mal, a melhor explicação ainda é a contida nas Escrituras. Ou o mal surgiu como resultado da escolha de um ser moralmente livre, ou Deus seria responsável pela existência do mal, o que patentemente seria um absurdo. A origem de Satanás está ligada à criação dos anjos, entre os quais ele ocupava uma posição de destaque. Na linguagem metafórica do profeta Ezequiel, era esse anjo “um querubim de guarda, ungido”, ocupando posição de honra junto do trono do Altíssimo, “perfeito” desde o dia em que foi criado, até pecar em conseqüência de orgulho desmedido. (Ezequiel 28:13-18).
Se Deus criou esse anjo extraordinário que, Isaías chama de Lúcifer (Isaías 14:12-14), anjo este que caiu em pecado, não permanece Deus ainda responsável pela origem do pecado, uma vez que o criador é onisciente?
Permita-me uma ilustração. Há muitos anos trás, destroçou-se no céu da Califórnia o avião experimental BFX, com um recorde de velocidade de 4 mil quilómetros horários. Era um laboratório voador em que se testava toda sorte de problemas encontrados na construção de aviões supersónicos. O investimento de capital era simplesmente fabuloso – da ordem de vários milhões de dólares. O BFX foi construído pela companhia North American Aviation. Alguém, desconhecendo as causas do acidente,poderia ter culpado a companhia construtora. “North American construiu…North American é responsável”.Várias investigações foram feitas, e finalmente ficou esclarecido que a culpa do acidente cabia não à construtora do avião, nem ao piloto, que era um dos mais capazes, mas à decisão de um grupo de funcionários da companhia, ansiosos de impressionar a nação e o congresso com um golpe de publicidade. O avião, que pertencia a uma classe inteiramente à parte, devia ser fotografado em formação cerrada, com três aviões menores. Nessas velocidades fantásticas, um dos aviões menores foi simplesmente “sugado” de encontro ao BFX, resultando na colisão fatal. A culpa do acidente não cabia à construtora, mas a alguém que abusou das qualidades extraordinárias do avião por motivo, podemos quase dizer, de vaidade.

O acidente acima projeta luz sobre o problema da origem do mal. Lúcifer foi criado um ser moral livre, dotado de nobres faculdades. Nada impedia, porém, que um ser moral abusasse de sua liberdade e viesse entreter orgulho exorbitante, aspirando a ser “semelhante ao Altíssimo” (Isaías 14:14), ou, como diz Ezequiel mais explicitamente, estimando o seu coração “como se fosse o coração de Deus” (Ezequiel 28:6). Nada compelia Lúcifer a pecar. Não foi defeito algum de sua natureza que criou esse pendor para o mal. Cabe exclusivamente a Lúcifer a responsabilidade de transformar a possibilidade de pecar, implícita na liberdade de um ser moral, em realidade.
Por que não foi Lúcifer, imediatamente extinto, poupando assim ao mundo a devastação do pecado com seu cortejo de sofrimento e morte? Não é Deus todo-poderoso?
Seria presunção imperdoável imaginar que nós, pobres mortais, pudéssemos compreender com meridiana clareza o problema suscitado com a introdução do mal no Universo. Há problemas que a própria Bíblia deixa envoltos no manto do silêncio. Quando as Escrituras não são explícitas no assunto, qualquer tentativa de penetrar o mistério do mal deve ser interpretada como construção provisória do raciocínio humano. Uma sugestão plausível é a seguinte: Tivesse Deus destruído Lúcifer de imediato, sem que a verdadeira natureza do pecado fosse compreendida, então os demais anjos teriam servido a Deus motivados por temor, e não unicamente por amor. Ora, é claro que neste Universo de Deus não deve haver, afinal, outro constrangimento que não o constrangimento do amor. ( II Coríntios 5:14).
Foi Lúcifer, acompanhado, em seu orgulho e rebelião, por outros seres celestiais?
Essa pergunta nos leva de volta ao assunto dos demónios e seu papel nas manifestações espiritualistas.

No capítulo 12 do Apocalipse, é-nos dado um rápido vislumbre dessa guerra no Céu, quand o Satanás, como líder da rebelião, arrastou “a terça parte das estrelas do Céu, as quais lançou para terra” (Apocalipse 12:4). No verso 7, as estrelas são identificadas com os anjos, pois lemos: “Houve peleja no Céu. Miguel e seus anjos pelejaram contra o dragão. Também pelejaram o dragão e seus anjos”. Em conexão com o mesmo assunto, o apóstolo Judas fala de “anjos, os quais não guardaram o seu estado original, mas abandonaram o seu próprio domicílio…” (Judas 6). Por incrível que pareça, houve anjos que, iludidos, escolheram a senda da rebelião e lançaram sua sorte com Satanás. Esses anjos, deformados em seu caráter pelo efeito corruptor do pecado, é que Paulo chama de “espíritos enganadores”, ou “demónios”. (I Timóteo 4:1). Há, conseqüentemente, uma hierarquia do mal a cuja testa está o “príncipe deste mundo”.
É crença de muitos que os espíritos dos mortos é que aparecem nas sessões espíritas. Qual a relação entre os “demônios” e as manifestações espíritas?

Se o homem morre como um todo; se, como ensinam as Escrituras, todas as suas atividades físicas, mentais e religiosas cessam com a morte (Eclesiastes 9:5, 6 e 10), evidentemente não há espírito ou alma que sobreviva ao corpo. O rei Ezequias, arrancado miraculosamente das garras da morte, expressou fielmente o pensamento bíblico em seu salmo de gratidão e louvor: “ A sepultura não te pode louvar, nem a morte glorificar-te; não esperam em tua fidelidade os que descem à cova”. (Isaías 38:18). Morte não significa vida sob forma alguma. Morte é efetivamente a cessação da vida, o final de toda atividade humana. Se não há “espíritos dos mortos” em nenhum sentido real, então não são eles que se manifestam em sessões espíritas, mas, sim, “espíritos enganadores” pretendendo ser os mortos invocados. A personificação é tão verossímil que milhares são iludidos. Seria temerário negar a inteligência diabólica que opera por trás dessas manifestações espíritas, diante das quais a mais perfeita dramatização no teatro é como uma imitação de amadores. Satanás e seus anjos estão empenhados em perpetuar a falsidade pronunciada no éden: “É certo que não morrereis”, contradizendo frontalmente a sentença divina: “Certamente morrerás” (Génesis 3:4 comparar com Génesis 2:7). Em última análise, toca a cada indivíduo decidir no foro de sua consciência se aceitará como verdadeira a declaração de Deus ou a de Satanás.
E sobre a sessão espírita em Em-Dor, quando o rei Saul invocou o espírito do profeta Samuel? Não diz a passagem em questão que o profeta Samuel de fato apareceu a Saul?

O capítulo 28 de I Samuel, onde se encontra o incidente acima referido, merece um estudo pormenorizado. Se não tivéssemos nenhuma outra referência ao assunto, nas Escrituras, senão a desse capítulo, poderíamos de facto, ficar perplexos. Felizmente não é esse o caso, e nosso dever é compreender uma passagem qualquer à luz do ensino total das Escrituras. A parte deve harmonizar-se com o todo, uma vez que o Espírito Santo presidiu à inspiração do todo.
Preliminarmente, convém notar que a prática pagã de invocar os mortos através de médiuns e adivinhos é expressamente proibida nas Escrituras, e o próprio Saul impôs a observância desse estatuto, no princípio de seu reinado. (I Samuel 28:3). O estatuto em questão encontra-se em Deuteronómio 18:10 e 11, e reza como segue: “Não se achará entre ti quem faça passar pelo fogo seu filho ou sua filha, nem adivinhos, nem prognosticadores, nem agoureiro, nem feiticeiro, nem encantador, nem necromante, nem mágico, nem quem consulte os mortos”. Essas práticas eram correntes entre as nações pagãs que ocuparam a Palestina antes dos israelitas, e são citadas como uma razão para seu desalojamento. Eram “uma abominação ao Senhor”, porque faziam de seus adeptos participantes voluntários de uma fraude satânica. O ressurgimento moderno dessas práticas, quase tão antigas quanto a raça, atesta da fascinação que o mistério da morte tem para o homem.
Além disso, o capítulo 28 de I Samuel torna bem claro que Saul, pela persistência obstinada no erro, tinha cortado qualquer possibilidade de comunicação com Deus, que não lhe respondia “nem por sonhos, nem por urim, nem por profetas” (verso 6). Seria, pergunto, crível que Deus, que não mais Se comunicava com Saul pelo que poderíamos chamar os canais normais, fosse permitir que o profeta Samuel, já falecido, aparecesse numa caverna ao chamado de uma médium espírita? Estaria o profeta de Deus sujeito à importunação de alguém cujas atividades eram contrárias às instruções divinas?

O relato dessa estranha sessão, na caverna de En-Dor, torna igualmente claro que Saul não viu Samuel. Apenas a médium teria visto um vulto subindo da terra, o qual Saul interpretou como sendo o profeta Samuel. Causa igualmente espécie que o “espírito” do bom profeta Samuel subisse da terra, em vez de descer do Céu, se é correto o ensino de que a alma dos bons vai para a presença divina, ao morrerem. Acresce a todas essas circunstâncias o facto de as Escrituras declararem que uma razão porque Saul perdeu a vida na inglória batalha do monte Gilboa foi precisamente “porque interrogara e consultara uma necromante” (I Crónicas 10:13), fazendo transbordar com esse gesto iníquo a taça de sua impiedade.
A única conclusão plausível é que a sessão mediúnica de En-Dor foi uma ofensa a Deus; que o que ali ocorreu não teve a sanção divina, porque Deus não permitiria o que uma vez proibira; que o profeta Samuel não compareceu à invocação de uma feiticeira, nem compactuou com uma atividade considerada abominável e pagã, e que todas as palavras que são atribuiídas à Samuel o são apenas num sentido metafórico. O que ocorreu em En-Dor pode melhor ser explicado como a manifestação de um espírito diabólico, que agia sob as ordens do príncipe das trevas, “com todo poder e sinais e prodígios de mentira”. (II Tessalonicenses 2:9). Que um anjo caído assumisse a aparência de um profeta, não é de admirar, pois, como escreveu o apóstolo Paulo, “o próprio Satanás se transforma em anjo de luz”. II Coríntios 11:14. Mistificação é apenas uma das atividades da grande conspiração do mal.
Como a profecia referente à morte de Saul e de seus filhos, no dia seguinte, pronunciada, por um anjo caído que personificava o profeta Samuel, veio a realizar-se literalmente? Pode Satanás ler o futuro?
Através do profeta Isaías, Deus lança vários desafios aos supostos deuses do paganismo, para que revelem o futuro: “Trazei e anunciai-nos as coisas que hão de acontecer; relatai-nos as profecias anteriores, para que atentemos para elas e saibamos se se cumpriram; ou faze-nos ouvir as coisas futuras. Anunciai-nos as coisas que ainda hão de vir, para que saibamos que sois deuses…’ De novo: “Quem há como Eu, feito predições desde que estabeleci o mais antigo povo? Que o declare e o exponha perante Mim. Esse que anuncie as coisas futuras, as coisas que hão de vir”.(Isaías 41:22, 23 e 44:7)
De acordo com estes versos, prever o futuro é uma prerrogativa divina. A Deus, somente, pertence o atributo da onisciência, a qual inclui o conhecimento do futuro. Deus, unicamente, tem em Suas mãos o futuro como um livro aberto. Os pagãos tinham os seus oráculos, mas a duplicidade e ambiguidade dos seus pronunciamentos são proverbiais. Homens em todos os tempos, e porque não dizer, anjos também, têm procurado levantar o véu que cobre o futuro. Em que pese o seu esforço, num Universo povoado por seres dotados do poder de escolha, o futuro permanecerá sempre ambíguo, excepto para Deus. Filósofos têm procurado em vão descobrir as “leis” da história, porque, se leis houvesse, o futuro seria previsível, ao menos em linhas gerais. A história permanece, no entanto, o registo de eventos únicos e irrepetíveis, porque atrás de cada evento há o elemento de novidade oculto na vontade de seres livres.

Nessas circunstâncias, podemos declarar sem hesitação que não está ao alcance do homem, nem de Satanás, descerrar o véu que cobre o futuro. O desafio divino, feito através de Isaías, nunca foi, nem poderá ser aceite. O máximo que seres finitos podem fazer é arriscar uma opinião inteligente quanto ao futuro. É possível fazer um prognóstico do curso provável dos acontecimentos; mas, entre um prognóstico e uma profecia, há um abismo de diferença. Não é preciso ser profeta para prognosticar que um exército maior e mais bem equipado levará a palma sobre um exército menor e deficientemente equipado, como regra geral. A necessidade de uma ressalva caracteriza toda prognosticação. Mesmo que acrescentássemos a cláusula, “sob comandos comparáveis”, ainda assim não se poderia transformar a prognose em certeza. Há, em qualquer situação humana, muitas variáveis que iludem o observador mais arguto. Era possível prever que quando a Alemanha invadiu a Polônia em 1939, os exércitos de Hitler ganhariam a vitória; mas não era possível afirmar quantos dias decorreriam antes do colapso dos defensores. Consta que Hitler consultava regularmente astrólogos e clarividentes, ao formular seus planos bélicos. Ada impediu, porém, que seus cálculos, quanto à batalha da Inglaterra, falhassem fragorosamente. Nem ele, nem seus assessores, contaram com a incógnita da determinação do povo inglês. Tão pouco podiam os melhores estrategistas arriscar a previsão, em 1941, de que as divisões blindadas alemãs, vitoriosas até então, estariam totalmente derrotadas quatro anos mais tarde. De novo as muitas variáveis do problema resistiam a qualquer análise lógica. De igual modo, quando, de acordo com Isaías 41 a 44, Deus desafiou os oráculos do paganismo que predissessem a carreira vitoriosa de Ciro da Pérsia, o silêncio foi geral. O futuro, exceto onde é objeto de uma revelação divina, permanece um livro fechado.
Mas não é verdade que Saul e seus filhos morreram no dia seguinte, conforme a previsão da feiticeira de En-Dor, ou de quem falou por seu intermédio?

Sou da opinião que Satanás, conhecendo muito bem o terreno, o valor dos combatentes, as circunstâncias da batalha, enfim, fez um prognóstico que se provou correto. Conhecia, digamos, 90% das variáveis do problema, e arriscou uma afirmação na base desse conhecimento. Acertou, mas podia ter errado. E aqui está o pivô da questão toda.. Os erros dos adivinhos são esquecidos por conveniência, ao passo que seus poucos sucessos são exagerados fora de toda proporção. Qualquer financeiro cujas previsões estivessem certas 51% das vezes, poderia enriquecer-se de um dia para o outro jogando na bolsa de valores. A verdade, porém, é que mesmo os peritos erram frequentemente em matéria de finanças. E Satanás certamente calculou mal quando confrontou Cristo com as tentações no deserto e foi derrotado as três vezes.
A história da predição correta, feita na caverna de En-Dor, foi narrada porque ela encerra uma lição moral, e não para fundamentar a teoria de que o “espírito” do profeta Samuel, compareceu, reclamado por uma pitonisa. Uma vez que Saul estava em rebelião contra Deus, a Fonte do seu poder, não era difícil prever o resultado da batalha no monte Gilboa.
Muitos argumentam que a aparição de Moisés e Elias com Cristo, no monte da transfiguração, é evidência de que os espíritos dos santos sobem ao Céu por ocasião da morte. Há alguma validade nesse argumento?

Não, não há validade alguma. Moisés e Elias constituem dois casos únicos na história bíblica. De Moisés, é-nos dito que morreu e foi sepultado. Excepcionalmente, porém, segundo a passagem pouco conhecida de Judas 9, Moisés foi chamado à vida pelo arcanjo Miguel.
Não tivesse Moisés experimentado uma ressurreição especial, sua sorte não teria sido diferente da de David, de quem Pedro afirma que “não subiu aos Céus”. Paulo concorre com o veredicto de Pedro, declarando: “Porque, na verdade, tendo David servido a sua própria geração conforme o desígnio de Deus, adormeceu, foi para juntos de seus pais e viu corrupção”. (Atos 2:34 e 13:36). David, como os demais santos, descansa na sepultura até ouvir a voz do Doador da vida.
Quanto a Elias, o relato bíblico é que foi trasladado, isto é, foi levado para o Céu num “carro de fogo”, sem experimentar a morte. Está, pois explicada, à luz das Escrituras, a presença de Moisés e Elias no monte da Transfiguração. Não foi a alma desses profetas que apareceu a Cristo no monte, mas ambos em pessoa.
Há quem creia que João batista seja Elias reencarnado. Dizem as Escrituras qualquer coisa sobre a reencarnação?
Tanto o termo como o conceito da reencarnação são estranhos às Escrituras. O veredicto bíblico é eloquente na sua simplicidade: “Aos homens está ordenado morrerem uma só vez”. (Hebreus 9:27). Uma única é a oportunidade do homem decidir seu destino eterno. “Hoje”, esta presente vida, “é o dia da salvação”. Há urgência no convite divino porque, nesta vida, sela cada qual a sorte de maneira irrevogável. A ideia da reencarnação é peculiar às religiões da índia, e chegou mesmo a colorir o pensamento do filósofo grego Platão. Mas, tanto a Bíblia como a voz da Igreja cristã, são unânimes em rejeitar essa idéia. Se a alma é a própria pessoa que cessa de existir com a morte, a possibilidade da reencarnação é, por esta mesma razão, excluída.
Quanto a opinião de ser João Batista uma reencarnação do profeta Elias, deixaremos a critério do leitor, depois de fazer as seguintes observações:

Há três passagens que devem ser examinadas sobre este assunto. Uma contém a resposta do próprio João Batista à pergunta que uma delegação de sacerdotes vindos de Jerusalém lhe fez: “És tu Elias? Ele disse: Não sou”. (João 1:21). Esta declaração taxativa devia encerrar o assunto, não fosse uma passagem que parece contradizê-la. Quando João estava preso por ordem de Herodes, Jesus teve a oportunidade de dar testemunho da missão do Seu precursor perante as multidões: “Que saístes a ver no deserto? Um caniço agitado pelo vento?…Mas, para que saístes? Para ver um profeta? Sim, Eu vos digo, e muito mais que profeta”. Jesus citou a seguir uma profecia de Malaquias, muito familiar aos Seus ouvintes: “Eis aí eu envio diante de tua face o meu mensageiro, o qual prepara o teu caminho diante de ti”. (Malaquias 3:1). Nesse sumário de Mateus, Jesus conclui as Suas observações, dizendo: “E, se o quereis reconhecer, ele mesmo é Elias, que estava para vir”. (Mateus 11:7-14). Nessa declaração final, Jesus fez uso de outra predição de Malaquais: “Eis que eu vos enviarei o profeta Elias, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor”.(Malaquias 4:5).
Duas possibilidades nos confrontam. Primeira: as palavras de Jesus devem ser tomadas literalmente, criando uma contradição com o testemunho do próprio João Batista, ou a profecia de Malaquias, à qual Jesus se referiu, deve ser compreendida figurativamente. Ora é este segundo sentido que lhe deu o anjo, quando anunciou o nascimento de João a seu pai Zacarias: “E irá adiante dEle (de Cristo) no espírito e poder de Elias, para converter os corações dos pais aos filhos”. (Lucas 1:17). Evidentemente, o anjo tem em mente a mesma profecia de Malaquias, e reconhece que esta não requer uma interpretação literal, mas tão-somente figurada. São João cumpriu a predição, vindo no “espírito e poder de Elias”, com o mesmo rigor ascético, com a mesma franqueza, dotado da mesma coragem para denunciar o pecado, tanto entre as massas, como na família de Herodes. O leitor concluirá por si se o texto de S.Mateus 11:14 suporta ou não a idéia da reencarnação.